24.7.13

Sai do chão, sai do chão, quem é contra a remoção.



Já tava bem confortável com meu amigo cão num sonho da madrugada, até que começou mais um episódio daqueles que a gente não pode deixar de anotar assim que acorda. No início parecia um grande palco de ensaio, bastidores, urdimento, coxias. Uma banda se organizava para ensaiar naquele espaço, a música era bastante familiar – a banda também. Dois sujeitos de terno foram mais ao fundo e rodeei-os como se tivesse uma câmera ficcional subjetiva. Eles conversavam algo conclusivo em voz baixa.

Então, tudo posto e entendido após esta introdução com cara de making of, aqui é que começa a história. Primeiro o lugar é contextualizado: plano geral de um pequeno edifício cinza solitário, sem vizinhos. Não dava pra entender quantos pavimentos eram, no máximo consegui perceber quatro, cinco andares contando as janelas.

Lá dentro, em um dos cômodos começava o que rapidamente identificaria como um 'laboratório de resistência.' As pessoas estavam ali contra a demolição do prédio e a remoção de seus moradores. E a banda que se propunha a compartilhar suas composições e letras, desdobrar novos arranjos a partir daquela experiência, era nada mais nada menos que os Beatles.

Pessoal, posso dizer que os rapazes eram muito legais, especialmente John e George. Bom, talvez os outros dois não estivessem lá, pensando bem. A coisa corria bem num clima de jam session, e nem um certo clima tenso no ar tirava a leveza e o foco das tarefas, o trabalho era de troca e era sério – de maneira que sabíamos que em algum momento chegaria a 'força da lei'. Contudo, isso nem de perto era uma expectativa. Adorei dar uns pitacos em Across the universe e The fool on the hill, e até riram quando perguntei de iam tocar Hey jude, 'meio chatinha, né?' Ufa, que alívio.

Quando a polícia chegou, pus a cabeça pra fora – uma janela velha com moldura de madeira já descascada– e lá estavam eles em boa parte da rua, os robocops do choque. Todos ali dentro mantiveram a tranquilidade. Na verdade continuavam indiferentes ao que se passava lá fora. Percebi então que a tarefa de descer era minha. O sisudo oficial de sei-lá-qual-a-patente com roupa de guerra e capacete queria dizer alguma coisa do tipo 'vamos invadir'. Eu fui rápido, com a cara que acusava a estupidez dele: 'tá maluco, mané, não tá ouvindo? São os Beatles!'

Lembro vagamente de mais pessoas chegando ao tal ensaio, mas 'encorpadas' (talvez fossem os policiais) que se agregavam ao ritual. Ninguém saiu.

Antes de acordar, li uma carta que deixaram. Fiz isso enquanto desproduziam o local. 'Tivemos realmente uma experiência muito boa, foi muito produtiva. Se muitas vezes não transparecemos isso, nos desculpem, é porque estávamos apenas muito cansados.'

Acho que a casa permaneceu em pé.

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